segunda-feira, 28 de abril de 2008

EURICO, O PRESBÍTERO


Resolvi postar em seções diferentes, vários trechos de uma linda obra da literatura universal: O Presbítero, de Alexandre Herculano, escrito pela primeira vez em 1843. Aliás, este mês de abril foi marcado para mim pela leitura de apenas livros daquele século.

Tive o prazer de ler a segunda parte do livro de Victor Hugo, "Os Miseráveis" (a primeira eu li no mês anterior, sugestão do Ricardo Gondim), cujo processo de escrita começou em 1824, terminando somente em 1853.

Depois li o delicioso livro "Inocência", do Visconde de Taunay, escrito também no século dezenove (1872). Conta a linda história de Cirino, jovem médico prático de interior que se apaixona perdidamente por Inocência, uma caboclinha com a pureza de uma criança e a beleza de uma mulher. Há momentos de ternura, suspense, graça e, como não deve faltar à uma obra clássica sobre o amor, alguma tristeza.

No livro "O Presbítero", Eurico é um homem rico, carismático e generoso. Apaixona-se por Hermengarda, filha de Fávila, Duque de Cantábria e irmã do célebre Pelágio. Sendo menos nobre que a família de sua amada, Eurico foi impedido de levar adiante esse amor, vendo sua Hermengarda ser-lhe tirada sem dó pelo pai.

A dor da perda foi tão severa em seu coração, que ele decide então ingressar no mundo religioso, tornando-se o presbítero de uma pequena vila, perto do mar. De coração generoso, além de ser um poeta vigoroso, ele passa a escrever sobre a dor do amor, as coisas da vida, sempre a partir da ótica cristã. São verdadeiros salmos que ele escreve, na solidão de suas frustrações e no amargor de sua realidade.

Agora, se isso aqui se propunha a ser apenas uma introdução aos seus escritos, imaginem vocês o que vêm por aí! Vou até esperar um pouco, depois de postar o primeiro, pra ver se vocês desejam mais uns trechos, ok?

I - O CORAÇÃO DO PRESBÍTERO

O presbítero Eurico era pastor da pobre paróquia de Cartéia. Descendente de uma antiga família bárbara, gardingo na corte de Vítiza, vivera os ligeiros dias da mocidade no meio dos deleites da opulenta Toletum. Rico, poderoso, gentil, o amor viera, apesar dissoquebrar a cadeia brilhante da sua felicidade. Namorado de Hermengarda, filha de Fávila, Duque de Cantábria, o seu amor fora infeliz. O orgulhoso Fávila não consentira que o menos nobre gardingo pusesse tão alto a mira de seus desejos.

Depois de mil provas de um afeto imenso, de uma paixão ardente, o moço guerreiro vira submergir todas as suas esperanças. Eurico era uma dessas almas ricas de sublime poesia a que o mundo deu o nome de imaginações desregradas, porque não é para o mundo entendê-las. Desventurado, o seu coração de fogo queimou-lhe o viço da existência ao despertar dos sonhos de amor que o tinham embalado. A ingratidão de Hermengarda, que parecera ceder sem resistência à vontade de seu pai, e o orgulho insultuoso do velho prócere deram em terra com aquele ânimo, que o aspecto da morte não seria capaz de abater.

A melancolia que o devorava, consumindo-lhe as forças, fê-lo cair em longa e perigosa enfermidade, e, quando a energia de uma constituição vigorosa o arrancou das bordas do túmulo, semelhante ao anjo rebelde, os toque belos e puros do seu gesto formoso e varonil transpareciam-lhe a custo através do véu de muda tristeza que lhe entenebrecia a fronte. O cedro pendia fulminado pelo fogo do céu.

Uma destas revoluções morais que as grandes crises produzem no espírito humano se operou então no moço Eurico. Educado na crença viva daqueles tempos, naturalmente religioso porque poeta, foi procurar abrigo e consolações aos pés de Aquele cujos braços estão sempre abertos para receber o desgraçado que neles vai buscar o derradeiro refúgio. Ao cabo das grandezas cortesãs o pobre gardingo encontrara a morte do espírito, o desengano do mundo.

Ao cabo da estreita senda da cruz acharia ele, porventura, a vida e o repouso íntimos? Era este o problema, no qual se resumia todo o seu futuro, que tentava resolver o pastor do pobre presbitério da velha cidade do Calpe.

A nova existência de Eurico tinha modificado, porém não destruído, o seu brilhante caráter. A maior das humanas desventuras, a viuvez do espírito, abrandara, pela melancolia, as impetuosas paixões do mancebo e apagara nos seus lábios o riso do contentamento, mas não pudera desvanecer no coração do sacerdote os generosos afetos do guerreiro, nem as inspirações do poeta. O templo havia santificado aqueles, moldando-os pelo Evangelho, e tornado mais solenes, alimentando-as com as imagens e sentimentos sublimes estampados nas páginas sacrossantas da Bíblia.

O entusiasmo e o amor tinham ressurgido naquele coração que parecera morto, mas transformados; o entusiasmo em entusiasmo pela virtude; o amor em amor dos homens. E a esperança? Oh, a esperança, essa é que não renascera!

Um comentário:

Anônimo disse...

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